
Olá minha “Menina”:
Chegou a hora do “ADEUS” final…
Foi um fim de semana de um enorme desgaste físico e principalmente emocional.
Há umas semanas prometi-te escrever outra carta… mas, eu previa este triste desfecho e fui perdendo a coragem; tomei outra decisão: não te deixar partir sozinha, sem ninguém por perto.
Então, comecei a rezar com confiança, pedindo a Deus que, na hora da tua partida eu estivesse por perto e assim aconteceu. Rezei colocando acima de tudo a vontade de Deus. Hoje posso dizer:
“Pai eu te dou graças porque me ouviste” (Jo 11,41).
Na noite de 5ª para 6ª feira, aconteceu algo estranho, quando me fui deitar, na hora das minhas orações, fui invadida por uma tristeza inexplicável, chorei convulsivamente durante alguns minutos e… senti que se aproximava o fim de algo que era muito doloroso para mim, juro que senti que ias partir.
Assim como um aviso por telepatia.
Na sexta-feira decidi que, depois de sair do trabalho, seguia directamente para o hospital e estaria junto a ti e foi isso que fiz.
Assim que entrei na sala dos cuidados intensivos e me aproximei de ti, tive um arrepio, a tua cor não enganava.
Aproximei-me e estavas meia adormecida; comecei a fazer-te festinhas e a conversar contigo e, de repente, tu abriste muito os olhos e fixaste-me, com muita atenção, e eu disse-te:
Meu doce, tu abriste os olhos para a Tia!!!
Tu estás a ouvir e sentir a Tia, aqui junto a ti?
Que coisa mais doce, esses olhos grandes, lindos, abertos a olhar para mim.
Que sorte eu tenho, a tua mãe queixa-se que há alguns dias que não abres os olhos e, agora, estás a olhar para mim, assim como, quem me quer dizer alguma coisa! Obrigado minha querida.
Tu continuavas de olhos bem abertos até que aproximou-se uma enfermeira e pediu que eu passasse para o outro lado pois ela queria ver se tinhas a comida no estômago ou não, através do tubo naso-gástrico.
Ali fiquei a ver o que acontecia e infelizmente saiu tudo que te tinha sido dado, o teu estômago há 2 dias que rejeitava toda a alimentação.
Presenciei actos de enfermagem que me foram explicados e que guardarei comigo, nas minhas memórias. Entretanto, alguém se aproximou de mim e disse:
Está lá fora o namorado, ele quer entrar!!!
Eu, com a voz sumida, respondi: Está bem, eu já vou sair.
Mas, algo de extrema sensibilidade aconteceu naquele momento.
A Enfermeira que estava do outro lado da cama disse:
Não, a Tia não sai, fica aqui junto à Tânia.
Deus iluminou aquela pessoa, que percebeu que era ali o meu lugar e, eu fiquei espantada com a reacção inesperada, pois sei quais são as normas, mas, naquele momento não havia normas, havia sim, um ser humano que agiu segundo aquilo que seria o melhor para a Tânia e para mim.
Louvo aquela enfermeira, que Deus a abençoe por ser uma pessoa muito humana.
Então, ela responsabilizou-se por deixar entrar o namorado e ficamos um de cada lado da cama. As lágrimas caiam cada vez com mais força, já não me conseguia controlar, foi a 1ª vez desde o início de todas as visitas que lhe fiz, que não me importei com as lágrimas, era a minha dor na hora da despedida. O choro tornou-se convulsivo, um nó apertava a minha garganta, o meu peito parecia querer rebentar...não podem imaginar.
O Cláudio agarrou-se a mim e fez-me uma festa a consolar-me.
Entretanto balbuciou: Não havia necessidade de chegar a este estado.
Depois concluiu: Ela não passa desta noite.
Eu acenei com a cabeça e confirmei as suas suspeitas.
Ao fim de uns minutos, o namorado perguntou-me:
Ainda fica aqui? eu disse-lhe: Fico até ao fim.
Ele saiu e senti que ficava feliz por alguém continuar ao lado da Tânia.
A Enfermeira foi buscar uma cadeira e colocou junto à cama da minha princesa, disse-me: sente-se! Baixou a cama para eu poder chegar-lhe à face e dei-lhe muitos beijinhos, conversei muito com ela, contei-lhe segredos ao ouvido e ao mesmo tempo o monitor acendia as luzes, os valores baixavam, de 50 que estava quando cheguei já estava em 30.
Levantei-me e fui ver as horas: 18h 20m. O meu receio era que chegasse as 19h e eu tinha que sair. Voltei para junto dela, continuei a dar-lhe beijos, muitos e repenicados, relembrei coisas da infância dela, quando eu lhe comprava os fatos de carnaval e ela toda vaidosa desfilava vestida de sevilhana e de princesa.
O monitor continuava a piscar e os valores a baixar.
Comecei a despedida e encaminhei-a para o Céu, disse-lhe:
Vais em breve para junto de Deus, vais encontrar os teus avós, os teus amigos, o teu namorado, todos te esperam; nós ficamos sem ti, mas tu vais para melhor. Vai em Paz, minha querida. este tormento tem que acabar.
Quando o monitor acusou uma linha recta e apareceu o zero, eu continuei a dar-lhe beijos, fazer-lhe festas e a dizer-lhe muitas coisas; estava na hora de eu me retirar, ciente de que, nada mais havia a fazer. Olhei para o seu rosto que estava bastante sereno e, eu também estava de bem comigo, pois foi um momento que jamais esquecerei.
Digo-te querida Tânia: nada acontece por acaso.
Deus escolheu-me para esta missão, que cumpri da melhor forma que sei fazer, com muito amor. O mesmo amor que sempre te dei durante a tua curta vivência na terra. Olhei para o relógio, marcava 18h 40m quando saí da sala; nem sequer tinha terminado a hora da visita, 19 horas.
Hoje, foi a última vez que te vi, despedi-me de ti, sem choros, pois sabia que foi o melhor para ti e, quando fecharam a urna e levaram para dentro do crematório, a minha consciência estava de bem comigo mesma, fiz tudo o que pude, quando foi necessário, agora rezarei por ti, todos os dias, todas as vezes que sentir vontade, sei que tu sabes que eu sempre te adorei. Descansa em Paz,meu anjo.